sábado, 14 de maio de 2011

[Reportagem] Ursula Rucker - 5 de Maio - Musicbox


Numa altura em que já se aquece/poupa para os grandes festivais de Verão – os cartazes estão praticamente fechados -, concertos como o de Ursula Rucker no Musicbox, no passado dia 5 de Maio, poderiam ressentir-se do grande investimento que o Verão exige a qualquer melómano que se preze. Não terá acontecido com Rucker que tinha à sua espera mais de meio Musicbox, para a receber, mais uma vez, de braços bem abertos.

Ursula Rucker faz parte de um restrito conjunto de músicos em que acreditamos quando nos dizem algo como “Esta é a minha casa. Não moro aqui, mas é como se morasse. Vocês são fantásticos”. Acreditamos porque existe uma genuína ligação entre a norte-americana e o público português – um dos primeiros a dar-lhe voz, literalmente. No ano passado vimo-la, sozinha, despida, num concerto que intitulámos “O Nu de Ursula Rucker”. Desta feita, Rucker veio vestida. Deixou a nudez para debate aceso noutras paragens (muçulmanas) e fez-se acompanhar de uma banda – baterista e guitarrista.

A entrada é gradual, primeiro o baterista, depois o guitarrista e, por fim, Ursula Rucker, toda ela estilo – chapéu, óculos escuros e roupa veraneante. Logo à primeira canção revela-se mais segura relativamente à anterior passagem nesta sala. “iphone, ipad, itunes, i am… here”, atira, sublinhando, mais uma vez, a sua posição relativamente ao tema “Internet versus Realidade”. Mas Ursula já vai revelando alguma abertura relativamente à Internet e às novas tecnologias. Em 2010 revelava não ter paciência para o Twitter. Em 2011 já tem página no Facebook e pergunta “onde está Maria?”, fruto de comunicação cibernética.

“She Said”, o novo disco, é o motivo principal deste espectáculo. A base é o spoken-word, mas o concerto é mais cantado do que falado. Trip-hop, reggae (spoken-reggae?), soul, blues, country, alguns apontamentos africanos - a América sulista, a Jamaica, Bristol e África, tudo parece caber no caldeirão da alemã.

Nos momentos memoráveis do concerto registámos uma canção que, no momento em que Ursula profere a frase mais lembrada do reggae, “one love!”, vemos vários casais abraçados. Mais: o registo acapella no final dessa mesma canção e «Fuck You», canção enorme em que um grande riff é acompanhado por “na na na’s” e por “fucks, muitos fucks”.

Mas Ursula Rucker não é apenas a (óptima) música que produz. Rucker conhece o poder das palavras e usa-as com mestria, dentro e fora das canções. “Por vezes questiono-me porque é que dou tanto numa canção. Só me apetece chorar!”, diz, a certa altura, emocionada. Numa outra situação, apresenta um poema escrito depois da catástrofe provocada pelo Furacão Katrina e o governo norte-americano. “Mesmo para as pessoas que achavam que o governo já estava todo “fodido”, foi um choque ver como esse mesmo governo deixou todas aquelas pessoas morrer”. Outra ainda: “Dizem que sou assustadora, não sou. Dizem que não sei escrever uma canção de amor. Pois aqui está uma canção de amor”. Todas estas tiradas, tão boas quanto sinceras, ajudam-nos a definir Ursula Rucker. Há mesmo algo de revolucionário em tudo isto quando a artista ergue o punho e repete “resist!”. E tudo isto é simbólico, numa altura em que os Homens da Luta estão na Alemanha a espalhar a sua mensagem de alegria, mas também de preocupação e Ursula Rucker vem da Alemanha, toda ela sorrisos, simpatia e alegria, espalhar a sua mensagem de luta neste Portugal que espera pelo bicho papão que é o FMI.

Em encore, “que seria feito de qualquer maneira”, somos presenteados com um mini instrumental com slide ao qual se segue «Supa Sista», o mais conhecido e celebrado tema de Rucker. O espectáculo acaba com o baterista a acelerar e o guitarrista a acompanhar num solo final. Quase perfeito.

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